Marianne

TEMOR E TREMOR
(O paradoxo da fé)


Na obra Temor e Tremor, Kierkegaard usará do pseudônimo Johannes de Silentio. O uso de Silentio, ou seja, “silêncio” é referente a alguém que não consegue ter, como Abraão, outra atitude a não ser ficar em silêncio diante do paradoxo da fé e de sua família; Abraão ficou em silêncio após a ordem de Deus para sacrificar seu filho Isaac, porque estava preocupado pelos temores do pensamento; o pseudônimo é proposital a causa.

Abraão (em hebraico: אברהם, Avraham ou ’Abhrāhām) é um personagem bíblico citado no Livro do Gênesis a partir do qual se desenvolveram três das maiores vertentes religiosas da humanidade: o judaísmo, o cristianismo e o islamismo.

“Deus pôs Abraão à prova e disse-lhe: toma o teu filho, o teu único filho, aquele que amas, Isaac; vai com ele ao país de Morija e, ali, oferece-o em holocausto sobre uma das montanhas que te indicarei.” (Kierkegaard, 1943, p. 113)

De início Kierkegaard propõe quatro situações diferentes que Abraão poderia ter passado diante da prova que Deus o colocou, ou seja, as possibilidades de resposta de Abraão ao pedido de Deus.

“Vale mais que me julguem um monstro do que perca a fé em ti” (Kierkegaard, 1943, p.114)

Na primeira situação há a saída de Abraão para o monte de Morija, onde aconteceria o sacrifício e o seu silêncio por todo o caminho. Isaac não compreendia nada do que estava acontecendo, pois só a fé é capaz de entender, é o paradoxo!

Na segunda versão Abraão volta do sacrifício e, após o retorno, envelhece rapidamente. Ele perde o brilho dos olhos. Enquanto isso, Isaac vai crescendo. Abraão não consegue se esquecer do que Deus havia lhe pedido, viveria então na dúvida sentimental entre Isaac e Deus.

Na terceira versão, após o sacrifício, Abraão pede perdão a Deus por ter pensado em sacrificar Isaac, objeto do seu amor. Ele lamenta por ter se esquecido do seu dever paternal para com o filho.

Na quarta versão Abraão e Isaac vão para o local do sacrifício, o monte Morija, em completa concordância e sem guarda de silêncio. No momento do sacrifício, Isaac nota o medo de Abraão; e por isso perde a fé.

Então Kierkegaard irá chamar Abraão de “o herói da fé”:

“Porque aquele que se amou a si próprio foi grande pela sua pessoa; quem amou a outrem foi grande dando-se; mas o que amou a Deus foi o maior de todos. (...) houve grandes homens pela sua energia, sabedoria, esperança ou amor – mas Abraão foi o maior de todos: grande pela energia cuja força é fraqueza, grande pelo saber, cujo segredo é loucura, pela esperança cuja forma é demência, pelo amor que é ódio a si próprio.” (Kierkegaard, 1943, p.117-8)


Mas o “herói da fé” enfrenta um problema complexo com a ética, pois segundo a ética, Abraão quer matar e por isso é denominado como um assassino, porém já na religião ele faz um sacrifício e por isso é um homem de fé. É o sacrifício que designa o caminho entre ética e religião, ora de um lado temos um assassino e de outro um homem da fé, mas afinal, Abraão é conhecido pela sua fé e não pela sua razão, pois pela razão não se mata em certos casos por assim dizer, mas pela fé sim, por isso é um absurdo a fé, um paradoxo que nos leva a refletir sobre o valor de uma vida.

O filósofo Albert Camus dirá que “julgar se a vida vale ou não vale a pena ser vivida é responder à pergunta fundamental da filosofia.” Então surge a questão: qual o valor da vida de um filho para um pai? Camus dirá:

“Galileu, que sustentava uma verdade científica, abjurou dela com a maior tranqüilidade assim que viu sua vida em perigo. Em certo sentido, fez bem. Essa verdade não valia o risco da fogueira. É profundamente indiferente saber qual dos dois, a Terra ou o Sol, gira em torno do outro. Em suma é uma futilidade.” (Camus, 1948, p. 19)

Supõe-se que a fé de Abraão era a Verdade para ele, e essa Verdade era intermediaria entre ele e seu deus, mas se ele abandonasse essa Verdade como Galileu abandonou? E se ele tivesse seguido a terceira hipótese que Kierkegaard lança:

“A tarde estava tranqüila quando Abraão se achou sozinho em Morija. Rojou-se na terra e pediu perdão a Deus pelo seu pecado, perdão por ter querido sacrificar Isaac, perdão por ter esquecido o dever paternal para com o filho. Tomou, de novo, com mais freqüência o solitário caminho da montanha, mas não encontrou repouso. Não podia conceber que pecara por ter querido sacrificar o seu mais precioso bem, por quem teria oferecido a vida mais de uma vez; e, se pecara, se nunca amara Isaac a tal ponto, não podia compreender como merecer o perdão de Deus – haverá, com efeito, mais horrível pecado do que o seu?” (Kierkegaard, 1943, p.115)

Kierkegaard escreveu certa vez a seguinte frase: “busco uma verdade que seja verdadeira para mim, a idéia pela qual eu possa viver e morrer”, essa frase reflete bem a admiração que Kierkegaard tinha por Abraão. Ter fé é ter uma idéia sobre algo da qual você viveria e morreria, mas nesse caso – mataria.

A fé é absurda porque nela tudo pode e esse caminho é um verdadeiro salto. Um homem pode ter fé, mas jamais fazer isso por outro homem, a fé é um fator individual. Para Kierkegaard a fé não é estética e nem instinto imediato do coração, mas um absurdo da vida, um paradoxo. Segundo nosso autor, fé significa recebimento e não renúncia.

Marcio Gimenes de Paula, doutor em filosofia pela Universidade Estadual de Campinas dirá que: “Nosso autor não vai interessar aqui pelo oculto do cômico, antes deseja desenvolver o oculto na estética e na ética para, dessa forma, mostrar a absoluta diferença entre o oculto estético e o paradoxo: “Assim, a estética exigia o oculto e recompensava-o; a ética exigia a manifestação e punia o oculto” (Kierkegaard, 1979, p. 162)”

Abraão não está na situação do herói trágico que deve escolher entre valores subjetivos (individuais e familiares) e valores objetivos (a cidade, a comunidade), como no caso da tragédia grega. Nada está em jogo, a não ser ele mesmo e a sua fé. Deus não está testando a sabedoria de Abraão, da mesma forma como os deuses testavam a sabedoria de Édipo ou de Agamenon. A força de sua fé fez com que Abraão optasse pelo infinito.

“Apesar de tudo Abraão acreditou e acreditou para esta vida. Se a sua fé se reportasse à vida futura, ter-se-ia, com facilidade, despojado de tudo para sair prontamente dum mundo a que já não pertencia.
Mas Abraão acreditou jamais duvidar. Acreditou no absurdo.” (Kierkegaard, 1943, p.120)


O que é então o absurdo? É dar o salto cego da fé, e esse salto não se reflete, não se questiona, ele salto é o próprio paradoxo, pois rompe com qualquer princípio ético pelo infinito, pelo intemporal, pela contemplação da beleza irracional da fé.

Quando Kierkgaard diz que Abraão acreditou sem duvidar e acreditou no absurdo, ele descreve perfeitamente o que é a fé. Num ponto de vista estético podemos representar da seguinte maneira: Deus falava diretamente com Abraão, e Abraão o contemplava, tal contemplação caminhava intencionalmente à beleza celeste, ao sublime e ao divino, por isso era inquestionável a fé de Abraão, pois remeter o seu querido filho ao sacrifício por uma entidade pertencente ao divino, permanecendo em silentio sem demonstrar qualquer desespero externo/interno, ele era realmente o pai da fé!

“Mas ele jamais duvidou, não relanceou o olhar à direita e à esquerda, não importunou o céu com súplicas”. (Kierkegaard, 1943, p.121)


Mas Kierkegaard dirá que

“Deus é amor; este pensamento tem, para mim, valor lírico fundamental. Presente em mim a certeza, sinto-me inefavelmente ditoso; ausente, suspiro por ela muito mais ansiosamente do que a amante pelo objeto do seu amor; mas não tenho fé; não tenho essa coragem.” (Kierkegaard, 1943, p.127)

Mas a concepção de que Deus é amor, surge depois do cristianismo, ou melhor, surge com o cristianismo, portanto o Deus de Abraão era um Deus que agia diretamente com seus servos. Se a idéia de que Deus é amor, Abraão jamais teria colocado seu filho ao sacrifício, por amor ao seu filho e não ao seu Deus, pois o amor não mata, o amor não machuca, não vinga, o amor no cristianismo é o amor de vida e não de morte, considerando a crença cristã de que Cristo morreu para salvar nossos pecados, e assim por diante.

Para finalizar esse raciocínio deixo uma reflexão de Kierkegaard sobre a fé:

“Pela fé, a nada renuncio; pelo contrário, tudo recebo, e, o que é mais notável, no sentido atribuído àquele que possui tanta fé como um grão de mostarda, porque então poderá transportar montanhas. É necessário uma coragem puramente humana para renunciar a toda temporalidade a fim de ganhar toda eternidade; mas elo menos conquisto-a e não posso, uma vez na eternidade, renunciar a ela sem contradição. Porém torna-se indispensável a humilde coragem do paradoxo para alcançar então toda a temporalidade em virtude do absurdo, e esta coragem só a dá a fé.” (Kierkegaard, 1943, p.137)
Marianne

ESTÉTICA

A palavra estética vem do grego aisthesis, com o significado de “faculdade de sentir”, “compreensão pelos sentidos”, “percepção totalizante”. A ligação da estética com a arte é ainda mais estreita se se considera que o objeto artístico é aquele que se oferece ao sentimento e à percepção. Por isso podemos compreender que, enquanto disciplina filosófica, a estética tenha se voltado para as teorias da criação e percepção artística.

Estética é um ramo da filosofia que tem por objeto o estudo da natureza do belo e dos fundamentos da arte. Ela estuda o julgamento e a percepção do que é considerado belo, a produção das emoções pelos fenômenos estéticos, bem como: as diferentes formas de arte e da técnica artística; a idéia de obra de arte e de criação; a relação entre matérias e formas nas artes. Por outro lado, a estética também pode ocupar-se do sublime, ou da privação da beleza, ou seja, o que pode ser considerado feio, ou até mesmo ridículo.
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O artista é criador de coisas belas.
Revelar a arte e ocultar o artista é a finalidade da arte.
O crítico é aquele que pode traduzir, de um modo diferente ou por um novo processo, a sua impressão das coisas belas.
A mais elevada, como a mais baixa, das formas de crítica é uma espécie de autobiografia.
Os que encontram significações feias em coisas belas, são corruptos sem ser encantadores. Isto é um defeito.
Os que encontram belas significações em coisas belas são cultos. Para estes há esperança.
Existem os eleitos para o quais as coisas belas significam unicamente Beleza.
Um livro não é, de modo algum, moral ou imoral. Os livros são bem ou mal escritos. Eis tudo.
A aversão do século XIX ao Realismo é a cólera de Calibã por ver o seu rosto num espelho.
A aversão do século XIX ao Romantismo é a cólera de Calibã por não ver seu próprio rosto no espelho.
A vida moral do homem faz parte do tema para o artista, mas a moralidade da arte consiste no uso perfeito de um meio imperfeito. O artista nada deseja provar. Até as coisas verdadeiras podem ser provadas.
Nenhum artista tem simpatias éticas. A simpatia ética num artista constitui um maneirismo de estilo imperdoável.
O artista constitui um maneirismo de estilo imperdoável.
O artista jamais é mórbido. O artista tudo pode exprimir. Pensamento e linguagem são para o artista instrumento de uma arte.
Vício e virtude são para o artista materiais para uma arte. Do ponto de vista da forma, o modelo de todas as artes é a do músico. Do ponto de vista do sentimento, é a profissão do ator.
Toda arte é, ao mesmo tempo, superfície e símbolo.
Os que buscam sob a superfície, fazem-no por seu próprio risco.
Os que procuram decifrar o símbolo, correm também seu próprio risco.
Na realidade, a arte reflete o espectador e não a vida.
A divergência de opiniões sobre uma obra de arte indica que a obra é nova, complexa e vital.
Quando os críticos divergem, o artista está de acordo consigo mesmo.
Podemos perdoar a um homem por haver feito uma coisa útil, contanto que não a admire. A única desculpa de haver feito uma coisa inútil é admirá-la intensamente.
Toda arte é completamente inútil.

[Oscar Wilde]
Marianne

Projeto de Estágio com os Alunos do Ensino Médio – Etapa II
Temática: “Relações do humano com o mundo: as possibilidades dos conhecimentos”

Subtema: “Concepções e experiências dos conhecimentos e suas verdades”

03/10/2011 – 6º Encontro

Sociedade e Cotidiano
(Ciência e Tecnologia)
Marianne e Donizete

A Sociedade e o Cotidiano entre os avanços tecnológicos e científicos
Parte I

Sociedade è Conjunto de indivíduos que vivem sob as mesmas normas e das relações entre eles.

Estamos vivendo a era da sociedade da informação, gestada pelas grandes descobertas tecnológicas no campo da automação, robótica e microeletrônica, que transformaram de maneira radical todos os setores de nossas vidas: a influência da mídia e da informática acelerou o processo de globalização, a partir de uma rede de comunicação que nos coloca em contato com qualquer lugar no mundo. (...) e uma nova cultura, a cultura da virtualidade real. (MARTINS&ARANHA 2003 p.26-7)

Vivemos em uma época em que nosso planeta é rodeado por satélites que mapeiam o mundo inteiro e nas ruas carros que mapeiam através de fotografias todas as cidades para serem exibidas no mesmo mapa. Podemos viajar pelo mundo através de um computador e conhecer pontos turísticos detalhadamente sem sair de casa; o que anteriormente era para nós histórias em quadrinhos, hoje se tornam realidade, porém nossa privacidade está cada vez mais ameaçada, pois vivemos na sociedade da cibercultura, em que tudo e todos são exibidos em tempo real no ciberespaço, ou seja, fotos, vídeos, particulares ou não, são exibidas para um público mundial na internet.

Surge também uma nova linguagem em que as abreviações das palavras são usadas frequentemente comprometendo a escrita dos indivíduos, em alguns casos o uso da língua inglesa, para algumas expressões, também são usadas, como em jogos virtuais online, por exemplo.

A sociedade virtual também afeta valores psíquicos dos indivíduos, como o desinteresse de sair de casa para ficar na internet, o anti-socialismo, é notável que muitos jovens prefiram ficar em casa no mundo virtual, que é um mundo que o isola do mundo real, do que sair e estar praticando um esporte com os amigos ou passear com os mesmos.

Notamos que os indivíduos socializam-se mais através das redes virtuais, muitos usam de máscaras para tal socialização, os chamados “fakes” do inglês “falso”, por isso a rede virtual tem seus perigos, como por exemplo, atrair o indivíduo para um crime, um seqüestro, pedofilia, etc.

Essa rede interativa parece não conhecer limites. Até que ponto estaremos “seguros”?
Marianne

INTRODUÇÃO A FILOSOFIA

FILO = AMOR    +   SOFIA = SABEDORIA è AMOR A SABEDORIA


Platão (em grego: Πλάτων, transl. Plátōn, "amplo", Atenas, 428/427 – Atenas, 348/347 a.C.) foi um filósofo e matemático do período clássico da Grécia Antiga, autor de diversos diálogos filosóficos e fundador da Academia em Atenas, a primeira instituição de educação superior do mundo ocidental. Juntamente com seu mentor, Sócrates, e seu pupilo, Aristóteles, Platão ajudou a construir os alicerces da filosofia natural, da ciência e da filosofia ocidental.

O MITO DA CAVERNA

Imaginemos um muro bem alto separando o mundo externo e uma caverna. Na caverna existe uma fresta por onde passa um feixe de luz exterior. No interior da caverna permanecem seres humanos, que nasceram e cresceram ali.
Ficam de costas para a entrada, acorrentados, sem poder locomover-se, forçados a olhar somente a parede do fundo da caverna, onde são projetadas sombras de outros homens que, além do muro, mantêm acesa uma fogueira. Pelas paredes da caverna também ecoam os sons que vêm de fora, de modo que os prisioneiros, associando-os, com certa razão, às sombras, pensam ser eles as falas das mesmas. Desse modo, os prisioneiros julgam que essas sombras sejam a realidade.
Imagine que um dos prisioneiros consiga se libertar e, aos poucos, vá se movendo e avance na direção do muro e o escale, enfrentando com dificuldade os obstáculos que encontre e saia da caverna, descobrindo não apenas que as sombras eram feitas por homens como eles, e mais além todo o mundo e a natureza.
Caso ele decida voltar à caverna para revelar aos seus antigos companheiros a situação extremamente enganosa em que se encontram, correrá, segundo Platão, sérios riscos - desde o simples ser ignorado até, caso consigam, ser agarrado e morto por eles, que o tomaram por louco e inventor de mentiras.
SIGNIFICADO

O mito da caverna é uma metáfora da condição humana perante o mundo, no que diz respeito à importância do conhecimento filosófico e à educação como forma de superação da ignorância, isto é, a passagem gradativa do senso comum enquanto visão de mundo e explicação da realidade para o conhecimento filosófico, que é racional, sistemático e organizado, que busca as respostas não no acaso, mas na causalidade.
Segundo a metáfora de Platão, o processo para a obtenção da consciência, isto é, do conhecimento abrange dois domínios: o domínio das coisas sensíveis (eikasia e pístis) e o domínio das idéias (diánoia e nóesis). Para o filósofo, a realidade está no mundo das idéias - um mundo real e verdadeiro - e a maioria da humanidade vive na condição da ignorância, no mundo das coisas sensíveis - este mundo -, no grau da apreensão de imagens (eikasia), as quais são mutáveis, não são perfeitas como as coisas no mundo das idéias e, por isso, não são objetos suficientemente bons para gerar conhecimento perfeito.
Marianne

O ALUNO SURDO EM ESCOLA REGULAR

O foco do texto trabalhado é problematizar a questão da construção da identidade do individuo surdo diante de sua inserção em sala de aula do ensino regular, com companheiros ouvinte. Cada indivíduo reconhece no outro um ser humano e é assim reconhecido por ele – sozinhos certamente não podemos ver reconhecida nossa humanidade, consequentemente não nos reconhecemos como humanos. Ter uma identidade humana é ser identificado e identificar-se como humano!

A identidade carrega consigo a historia. Dessa forma, considera que não há personagens fora de uma história, assim como não há historia sem personagens.

Temos o exemplo de Ricardo, na infância, as dificuldades eram muitas, ele não era considerado pela família como membro desta, não havia uma comunicação estabelecida entre seus familiares e ocorria uma construção de identidade baseada naquilo que ele não é, ou seja, ouvinte.

Mas ele conhece a Comunidade Surda de diversos lugares, viaja, identifica-se com Surdos usuários da língua de sinais e é reconhecido e valorizado pela comunidade como pessoa Surda.

O estudo de Perlin contribuirá ao enfocar as dificuldades de identificação dos sujeitos surdos, as relações de poder que afetam as identidades assumidas pelos surdos, compreendendo de forma abrangente a problemática da identidade.

A linguagem ocupa papel central no desenvolvimento humano, pois é na linguagem que se torna possível significar o mundo, as ações, as pessoas, e é baseando-se nessas significações que podemos construir sempre novos conhecimentos, inclusive sobre nós mesmos. Por meio da linguagem podemos modificar o mundo e sermos modificados por ele. É nas relações sociais, nas intervenções das pessoas, principalmente pela linguagem, que o desenvolvimento ocorre.

Molon afirma que o eu se constrói na relação com o outro, num sistema em que a palavra permite o contato social ao mesmo tempo em que é constituinte do comportamento social e da consciência. Este reconhecimento eu-outro ocorre ela interação entre os sujeitos.

Na concepção de inclusão que se concretiza pela inserção de alunos com necessidade especiais na sala regular, a criança surda estabelece relações com pessoas ouvintes que partilham entre si uma mesma língua. Os alunos surdos são prejudicados no que se refere ao compartilhar uma língua, não podendo vivenciar amplamente a polissemia desta, tão rica e importante para sua constituição como sujeitos.

Tratando de surdos de modo igual a todos os outros alunos, como se fosse portanto, ouvinte. Desta forma, a inclusão lida com a surdez simplesmente negando-a, considerando-as ouvintes e tendo-as somente como “corpo-físico”.

É nas relações sociais, nas vivencias e experiências partilhadas com os outros que nos constituímos sujeitos, nos tornamos nós mesmos. Somos ao mesmo tempo sujeito social e individual.

O espaço escolar passa a admitir que outra língua circule no meio acadêmico (língua de sinais), além daquela de domínio do grupo majoritário (ouvinte). O Surdo é, então, valorizado em sua língua, e um interprete (competente em sinais) é quem propicia seu acesso aos conhecimentos acadêmicos.

O modo como a escola está levando pedagogicamente não leva em conta a surdez e sua complexidade, não atendendo, assim, às necessidades dos surdos.

Acompanhamos a experiência de inserção de uma criança surda acompanhada de uma interprete, em uma sala de ensino regular. Nesta pratica educacional, o único interlocutor que tem semelhanças com a criança surda é a interprete.

O sujeito focalizado, Gu, é uma criança que nasceu ouvinte e aos 3 anos apresentou um quadro de meningite que deixou como seqüelas uma perda auditiva bilateral profunda, além de algumas alterações neurológicas em todo em céfalo, que limitaram o desenvolvimento de sua oralização e de habilidades para leitura orofacial. Ele não faz uso de prótese auditiva por opção própria. Por volta dos 6 anos, entrou em contato com a Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) por intermédio de sua fonoaudióloga, e mostrou boa aceitação e envolvimento no seu uso. A família também se interessou em aprender a Libras e o convício familiar alterou-se positivamente a partir do uso dessa língua.

O currículo escolar está preparado e pensado para crianças ouvintes, contemplando conteúdos pedagógicos amplos, envolvendo também música e arte. O ato de escutar musica e sentar em roda para cantar é um ritual comum entre ouvintes. O aluno surdo é chamado a participar, mas esse convite parece desconsiderar sua condição de “não ouvinte”. A interprete pede para que Gu coloque a mão sobre as caixas de som para sentir as vibrações e ele começa a fazer umas “batucadas”, e o aluno surdo comporta-se como um ouvinte que possui interprete e assume uma identidade de ouvinte.

A diferença deveria ser tratada com mais ousadia, sem medo de criar no aluno uma “imagem negativa”, já que a surdez é real e merece ser enfrentada. Em vez disso, o que se observa em muitos momentos são tentativas de torna-los ouvintes, buscando o apagamento da questão da diferença. Tornar o surdo ouvinte resolve aparentemente o problema da escola, pois, dessa forma, ela não precisa lidar com a diferença e com as dificuldades que esta acarreta.

A proposta de inclusão/inserção de alunos surdos está em curso. A questão de inclusão é significativa, justamente porque, como uma política oficial, tem sido vista positivamente por que a prega e se tem revelado como uma realidade mascarada para quem a vive, precisando urgentemente ser repensada.

A inclusão de crianças surdas desde as séries iniciais pode trazer conseqüências sérias para o processo de aprendizagem. A escola recebe a criança em um momento fundamental de sua constituição enquanto sujeito e seria importante o contato com outros surdos. Para uma criança em formação, essa situação criada em torno de uma ilusória inclusão pode ser bastante complexa e prejudicial.

È preciso que as políticas de inclusão abracem utopias e que a escola verdadeiramente encare os problemas de modo que os contemplo em sua totalidade. Dessa forma, a constituição dos sujeitos surdos poderá fluir a partir das relações surdos-surdos, surdos-ouvintes, criando possibilidades que incluam a condição cultural.
Marianne

SERÁ QUE A RELIGIÃO É CAPAZ DE CURAR NOSSOS PROBLEMAS?


O medo do perigo mortal que a humanidade corre está levando os homens a buscarem refúgio em Deus cada vez mais. Os que repudiaram o cristianismo, como Hitler, fizeram coisas horríveis, o que nos traz o pensamento de que, se todos voltassem ao cristianismo as coisas seriam mais corretas.

“É a questão de saber se as sociedades são capazes de terem a mínima moral se não forem auxiliadas pela religião dogmática.” (pág.164)

Russel dirá ainda que algumas virtudes muito importantes são mais encontradas com mais probabilidade entre aqueles que rejeitam os dogmas religiosos do que entre aqueles que os aceitam, pelo habito de decidir questões aflitivas  de acordo com as evidencias ou deixa-las sem respostas quando forem inconclusivas.

“Se as pessoas puderem ser persuadidas de que existe um Deus que punirá o roubo, mesmo quando a polícia falhar, parece provável que essa crença virá a promover a honestidade. Dada uma população que já acredite em Deus, ela logo acreditará que Deus proibiu o roubo. (...) À medida que a civilização progride, as sanções terrenas se tornam garantidas e as sanções divinas, menos. As pessoas vêem cada vez mais razão para pensar que, se roubarem, serão apanhadas (...) Hoje em dia é difícil até mesmo pessoas altamente religiosas acreditarem que irão para o inferno se roubarem.” (pág. 166)

As pessoas estão cada vez mais convencidas de que a punição virá das mãos dos homens e não de Deus, sabe que se roubarem serão apanhadas pelo próprio homem e não castigadas pelo poder divino, então não cometem um crime por saberem que serão presas, ao invés de acreditarem que irão para o inferno. Em séculos passados o castigo era feito lançando as pessoas questionadoras à fogueira, dirá Russel.

“Quando as pessoas argumentam, por exemplo, a favor do cristianismo, não dão, como Tomás de Aquino, razões para supor que existe um Deus e que Ele expressou seu desejo por meio das Escrituras.” (pág. 167)

Diferente dos cientistas quando discutem procuram a lógica e a razão para chegar a uma conclusão sobre determinado fato, Russel dirá que

“Quando dois homens de ciência discordam, eles não invocam o braço secular; esperam até que haja mais evidência para resolver a questão, porque, na posição de homens de ciência, sabem que nenhum deles é infalível. Mas, quando dois teólogos discordam, já que não existem critérios a que possam recorrer, não há nada além de ódio mútuo e apelo à força, aberto ou dissimulado. O cristianismo, reconheço, hoje causa menos mal do que costumava causar; mas isso acontece porque se acredita nele com menos fervor.” (pág. 168-9)

No Ocidente prevalece o cristianismo, ele é essencial para a virtude e estabilidade social, mas, dirá Russel, não é por esse caminho que o mundo poderá ser salvo do desastre. Vemos guerras serem formadas devido à discordâncias religiosas, porém mesmo atravessando esse caminho que se forma quando dois lados discordam de um mesmo ponto, com o avanço cientifico e social, as pessoas vêm cada vez mais seguindo a razão do que o seu fervor religioso.

Conclui-se então que atualmente a religião não pode curar nossos problemas, pode auxiliar raramente em questões morais, mas não em soluções sociais.

RUSSEL, B. Porque não sou cristão: e outros ensaios a respeito de religião e assuntos afins – Porto Alegre, RS: L&PM, 2009.