O ALUNO SURDO EM
ESCOLA REGULAR
O foco do texto trabalhado é
problematizar a questão da construção da identidade do individuo surdo diante
de sua inserção em sala de aula do ensino regular, com companheiros ouvinte.
Cada indivíduo reconhece no outro um ser humano e é assim reconhecido por ele –
sozinhos certamente não podemos ver reconhecida nossa humanidade,
consequentemente não nos reconhecemos como humanos. Ter uma identidade humana é
ser identificado e identificar-se como humano!
A identidade carrega consigo a
historia. Dessa forma, considera que não há personagens fora de uma história,
assim como não há historia sem personagens.
Temos o exemplo de Ricardo, na
infância, as dificuldades eram muitas, ele não era considerado pela família
como membro desta, não havia uma comunicação estabelecida entre seus familiares
e ocorria uma construção de identidade baseada naquilo que ele não é, ou seja,
ouvinte.
Mas ele conhece a Comunidade
Surda de diversos lugares, viaja, identifica-se com Surdos usuários da língua
de sinais e é reconhecido e valorizado pela comunidade como pessoa Surda.
O estudo de Perlin contribuirá ao
enfocar as dificuldades de identificação dos sujeitos surdos, as relações de
poder que afetam as identidades assumidas pelos surdos, compreendendo de forma
abrangente a problemática da identidade.
A linguagem ocupa papel central
no desenvolvimento humano, pois é na linguagem que se torna possível significar
o mundo, as ações, as pessoas, e é baseando-se nessas significações que podemos
construir sempre novos conhecimentos, inclusive sobre nós mesmos. Por meio da
linguagem podemos modificar o mundo e sermos modificados por ele. É nas
relações sociais, nas intervenções das pessoas, principalmente pela linguagem,
que o desenvolvimento ocorre.
Molon afirma que o eu se constrói na relação com o outro,
num sistema em que a palavra permite o contato social ao mesmo tempo em que é
constituinte do comportamento social e da consciência. Este reconhecimento eu-outro ocorre ela interação entre os
sujeitos.
Na concepção de inclusão que se concretiza
pela inserção de alunos com necessidade especiais na sala regular, a criança
surda estabelece relações com pessoas ouvintes que partilham entre si uma mesma
língua. Os alunos surdos são prejudicados no que se refere ao compartilhar uma
língua, não podendo vivenciar amplamente a polissemia desta, tão rica e
importante para sua constituição como sujeitos.
Tratando de surdos de modo igual
a todos os outros alunos, como se fosse portanto, ouvinte. Desta forma, a
inclusão lida com a surdez simplesmente negando-a, considerando-as ouvintes e
tendo-as somente como “corpo-físico”.
É nas relações sociais, nas
vivencias e experiências partilhadas com os outros que nos constituímos
sujeitos, nos tornamos nós mesmos. Somos ao mesmo tempo sujeito social e individual.
O espaço escolar passa a admitir
que outra língua circule no meio acadêmico (língua de sinais), além daquela de
domínio do grupo majoritário (ouvinte). O Surdo é, então, valorizado em sua
língua, e um interprete (competente em sinais) é quem propicia seu acesso aos
conhecimentos acadêmicos.
O modo como a escola está levando
pedagogicamente não leva em conta a surdez e sua complexidade, não atendendo,
assim, às necessidades dos surdos.
Acompanhamos a experiência de
inserção de uma criança surda acompanhada de uma interprete, em uma sala de
ensino regular. Nesta pratica educacional, o único interlocutor que tem
semelhanças com a criança surda é a interprete.
O sujeito focalizado, Gu, é uma
criança que nasceu ouvinte e aos 3 anos apresentou um quadro de meningite que
deixou como seqüelas uma perda auditiva bilateral profunda, além de algumas
alterações neurológicas em todo em céfalo, que limitaram o desenvolvimento de
sua oralização e de habilidades para leitura orofacial. Ele não faz uso de
prótese auditiva por opção própria. Por volta dos 6 anos, entrou em contato com
a Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) por intermédio de sua fonoaudióloga, e
mostrou boa aceitação e envolvimento no seu uso. A família também se interessou
em aprender a Libras e o convício familiar alterou-se positivamente a partir do
uso dessa língua.
O currículo escolar está
preparado e pensado para crianças ouvintes, contemplando conteúdos pedagógicos
amplos, envolvendo também música e arte. O ato de escutar musica e sentar em roda
para cantar é um ritual comum entre ouvintes. O aluno surdo é chamado a
participar, mas esse convite parece desconsiderar sua condição de “não
ouvinte”. A interprete pede para que Gu coloque a mão sobre as caixas de som
para sentir as vibrações e ele começa a fazer umas “batucadas”, e o aluno surdo
comporta-se como um ouvinte que possui interprete e assume uma identidade de
ouvinte.
A diferença deveria ser tratada
com mais ousadia, sem medo de criar no aluno uma “imagem negativa”, já que a
surdez é real e merece ser enfrentada. Em vez disso, o que se observa em muitos
momentos são tentativas de torna-los ouvintes, buscando o apagamento da questão
da diferença. Tornar o surdo ouvinte resolve aparentemente o problema da
escola, pois, dessa forma, ela não precisa lidar com a diferença e com as
dificuldades que esta acarreta.
A proposta de inclusão/inserção
de alunos surdos está em
curso. A questão de inclusão é significativa, justamente
porque, como uma política oficial, tem sido vista positivamente por que a prega
e se tem revelado como uma realidade mascarada para quem a vive, precisando
urgentemente ser repensada.
A inclusão de crianças surdas
desde as séries iniciais pode trazer conseqüências sérias para o processo de
aprendizagem. A escola recebe a criança em um momento fundamental de sua
constituição enquanto sujeito e seria importante o contato com outros surdos.
Para uma criança em formação, essa situação criada em torno de uma ilusória
inclusão pode ser bastante complexa e prejudicial.
È preciso que as políticas de
inclusão abracem utopias e que a escola verdadeiramente encare os problemas de
modo que os contemplo em sua totalidade. Dessa forma, a constituição dos
sujeitos surdos poderá fluir a partir das relações surdos-surdos,
surdos-ouvintes, criando possibilidades que incluam a condição cultural.
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